domingo, 23 de janeiro de 2011

A MIM O FIZESTES

MARINA

Não viste, porventura, o céu como está lindo?

Como os astros estão em pleno azul fulgindo?

O céu, o céu azul, o céu cheio de estrelas,

nessas noites de luar, miríficas e belas,

o céu é para mim um doce enlevo de alma.

Há tanta luz... há tanto encanto... há tanta calma,

que a gente cuida entrar nos paramos divinos,

ouvindo a orquestração dos mais profundos hinos!

Sozinha muita vez, eu fico embevecida,

sem mais pensar na dor em que se passa a vida,

a contemplar o céu distante, os sóis fulgentes,

miríades de sóis, grandes, tremeluzentes,

estrelas de clarões miríficos, profundos,

astros que, para mim, são outros tantos mundos. ..

Que belo é ver o céu, o espaço constelado,

esse zimbório imenso, etéreo, iluminado!

Não viste, porventura, o céu ainda, o lindo

cortinado onde estão as estrelas fulgindo?

Dizem que nele existe um rio, caudaloso,

cuja água de cristal a todos dá repouso. . .

Dizem que desse rio à margem muitas crianças,

tocando tamboris, ao compasso de danças, vivem alegremente e sem tristeza alguma

que lhes possa envolver o céu em densa bruma...

Será verdade, pois, que elas, essas criancinhas,

no rio vão tirar água com canequinhas

de ouro amarelo como as frutas bem maduras?

Como felizes são todas essas criaturas!

CELINA

Ora, vou contar-te uma história pungente que enche de comoção o espírito da gente.


CELINA

Eu era pequenina ainda, quando, um dia,

ao regressar da escola, estudante de alegria,

encontrei no caminho uma criança, coitada,

de cabelo revolto e veste esfarrapada,

de pés descalços, triste e lacrimosa mesmo,

que era de causar pena, a pobrezita a esmo...

E pediu-me uma esmola, assim, piedosamente,

estirando-me a mão, num gesto comovente:

— Menina, estou com fome e, por sua bondade,

dê-me uma esmola, ouviu? Tenha de mim piedade.

Abri, então, a bolsa em que os livros trazia,

nem um vintém sequer, nem um vintém havia!

Confesso que fiquei bastante entristecida

e senti a maior angústia desta vida,

por não poder fartar aquela pobre criança

de olhar tão dulçuroso e voz tão pura e mansa.

Ofereci-lhe almoço em minha casa, e a pobre,

num gesto muito bom e sobretudo nobre,

sobre o peito cruzando as mãos emagrecidas,

olhava para o céu das nossas duas vidas:

eu, tão feliz no mundo, e ela, tão pobrezita,

tão triste na orfandade e tão cansada e aflita.

Não achas que fiz bem?! Não achas que cumpria

um restrito dever, de que Deus me incumbia?

MARINA

Fizeste muito bem. Obraste retamente, Deus não esquecerá teu gesto comovente. Cumpriste o teu dever, porquanto está escrito que se deve atenuar a dor ao que anda aflito, dar pão ao que tem fome, e vestes, ao despido, e água ao que está sedento, e gozo, ao oprimido. A tua boa ação vale por um tesouro e escrita está nos céus com grandes letras de ouro!

CELINA

Por isso, toda vez que fico, embevecida,

olhando para o céu, alheio à humana vida,

me lembro da orfãzinha e parece que a vejo

de mãos postas ao peito e a voz em gorgolejo,

dizendo para mim: — Menina, você é boa;

E Deus, a quem é bom, sempre, sempre abençoa...

O tempo tem passado e eu nunca mais no mundo

a pobre pude ver, de olhar triste e profundo.

Talvez ainda viva aquela humilde criança,

cujo divino olhar não me sai da lembrança.. .

Talvez Deus a chamou — quem sabe? — para a glória,

para o reino dos céus, num canto de vitória...

MARINA

Tu és muito feliz, mais do que eu certamente,

Porque sabes amar o próximo piamente!

O bem que tu fizeste àquela pequenina,

não lhe fizeste a ela apenas: mais do que isto,

fizeste aquele bem imenso a Jesus Cristo!

Quem faz um benefício a um desses, sem vaidade,

tem-no feito a Jesus, que está na eternidade,

pois ele disse aos seus apóstolos amados

que quem assim fizesse aos mais necessitados,

a ele mesmo, enfim, o estaria fazendo.. .

CELINA

Fi-lo. sim, a Jesus somente, bem o entendo, porque naquele tempo eu muito bem sabia que por mim meu Jesus morrera certo dia, mas não me lembro mais do nome da criancinha, sei que ela era, coitada, humilde e pobrezinha.. .

MARINA

Desejarias ver, porventura, essa criança, cujo olhar te perdura ainda na lembrança?

CELINA

Ah! Eu me sentiria alegre se inda a visse

com aquele mesmo olhar mui cheio de meiguice,

para do meu Jesus falar-lhe e redimi-la

do pecado em que jaz, talvez, triste e intranqüila.

Mas deve já ser moça e, para conhecê-la. . .

MARINA

Deus te abençoe! Os céus te sejam benfazejos, são estes, pois, os meus fervorosos desejos, porque aquela criancinha esfarrapada e triste que pra almoçar contigo, um dia, conduziste, também hoje é cristã, também hoje é remida por aquele que deu por todos nós a vida! Aquela pobrezita humilde e pequenina,

é hoje tua irmã na fé: sou eu, Celina!

0 Escreva um pouco sobre minha postagem aqui:

Postar um comentário

 
temas blogspot - mario jogos